segunda-feira, 22 de outubro de 2007

Dilúvio Interior

Mais um texto genial tirado do Neural Noise, o blog do Renato:
www.thelusions.blogspot.com
--------------------------------------------------

Tenho um amigo que se mudou pra um apartamento super legal e perto da minha casa. Tem três andares. Embaixo fica um quarto bacana, com luzes de motel e hidromassagem. No andar do meio tem a cozinha e sala, e no andar de cima uma sala de tv e um terraço com churrasqueira. E o amigo recentemente adotou dois gatitos fantásticos, o Panda e o Zurugui, que tem apenas três pernas. Quando ele foi adotado ele tinha quatro, mas isso é outra história.

Pois o amigo foi viajar uma semana e pediu que eu passasse pra ver seus gatos, o que fiz com prazer não só pelos gatos, que são umas figuras, mas em retribuição pelo fato de que ele visita meus gatos quando viajo. E claro, pela hidro.

Pego minha moto e vou pra casa do sujeito. Sei que é perto mas qualquer coisa é um bom pretexto pra andar de moto (e ser burro, segundo alguns). Abro um vinho que encontro na adega do colega, mas não dos bons porque esses ele esconde. Deixo a banheira a encher de água e subo ao terceiro piso pra fumar um cigarrinho. Idiossincrática, a banheira só enche com água fria. Baforadas depois, volto para baixo, vejo que a água já cobriu os jatos da hidromassagem, ponto em que liga-se a circulação e o aquecimento.

Leva uns vinte minutos pra esquentar a água toda, então pego duas revistas Veja e vou ler lá em cima.Não sei o que aconteceu primeiro, se foi um insight de "SERÁ QUE EU FECHEI A TORNEIRA??" ou se foi por ouvir um som meio molhado "splosh splosh", como um mar.Desço correndo e vejo que o andar inteiro estava alagado e a água agora invadia o andar de cima. Mentira, claro.Desço correndo e vejo que a banheira estava transbordando, a água tinha invadido tudo, o ralo do banheiro que era a primeira defesa estava fechado, o colchão que fica no chão estava molhado e os gatos flutuavam em balsas improvisadas como pequenos náufragos.

A primeira coisa que eu vi foi a banheira transformada em cachoeira, só me dei conta do tamanho do dilúvio quando vi que tinha molhado as meias, enquanto pensava em como iria repopular o mundo com apenas dois gatos, machos e castrados.Primeiro fechar a torneira e desligar a hidro. Para isso sou obrigado a tirar a roupa toda menos a cueca, que achei que não molharia mas molhou. Tiro a tampa da banheira e abro o ralo ali do chão (o ralito, o ralito!!). Os gatos me olhavam de uma forma estranha.

Me pareceu um bom momento pra entrar em pânico, o que faço com destreza. O brother vai me matar. Ele quase matou a namorada, hoje ex, quando ela fez algo similar, imagine o que ele vai fazer comigo, que nem faço sexo com ele. A água vai invadir o vizinho, que vai chamar os bombeiros, arrombam a porta e eu vou estar aqui de cueca entre gatos flutuantes.Arranco os lençóis da cama e tento fazer uma barreira, sem sucesso, enquanto os gatos já tinham dominado as técnicas de navegação à vela e ia de uma lado pro outro desse novo mar.

Dobro o colchão ao meio, o que serve apenas pra permitir que a água vá mais longe e molhe ainda mais partes do colchão. Subo correndo e volto armado com um rodo.O que aconteceu em seguida não foi uma cena de Fantasia, com o Mickey de aprendiz de feiticeiro controlando água e vassouras. Foi mais parecido com Escrava Isaura.

Passei as três horas seguintes lutando com a água, estica rodo, puxa rodo, o que me deu uma horrenda dor nas costas pela semana seguinte. O Banheiro era um degrau ao contrário, mais alto que o resto do chão, então para esvaziar o quarto era necessário fazer a água subir um degrau e chegar no elevado ralo. Usando um rodo. Acreditem, é difícil. Os gatos abandonaram a navegação e ficaram sapateando na água como banhistas felizes. Só faltou cantarem "singing in the rain".Vou até o andar de cima e volto com um ventilador, que coloco basculando na direção do colchão, torcendo pra que nada mofe, e que o quarto volte ao normal antes do amigo voltar.

Quando tudo parece normalizado, encho a banheira e a taça de vinho e submerjo em ambas, me esquecendo do rodinho, que ficou lá embaixo como incriminadora prova.E caso algum dia o tal brother leia isso aqui, já deixo bem claro: isso aqui é ficção e nunca aconteceu, juro. Podem perguntar pros gatos.

Um comentário:

André Palhano disse...

Sem comentários. Alguém aí conhece um bom catsiter?